Biblioteca comunitária traz esperança e dignidade a crianças do Recife.

Imagem: Photographer: healingdream


por: Kleber Nunes - 02/12/2010. Publicado originalmente no site Viva Favela.
Recife/ PE.
O colorido da fachada chama a atenção. As cores vivas e alegres do graffiti fazem com que o imóvel destoe de todas as outras casas da rua Campo Tabaires, na comunidade do Caranguejo, localizada no bairro da Ilha do Retiro, zona Oeste do Recife. A rua, umas das principais do local, é estreita, não tem pavimentação e o esgoto corre a céu aberto, mas desde 2005 a via abriga uma biblioteca comunitária, que é o orgulho dos moradores da localidade. Também não é para menos, o local acolhedor, limpo e organizado proporciona o contato com gênios da literatura como José de Alencar, Manuel Bandeira, Clarice Lispector, Monteiro Lobato dentre outros, despertando a esperança de um futuro melhor para a comunidade. Os livros são disponibilizados de segunda a sexta-feira, das 8h às 21h.
A iniciativa partiu da inquietação do jovem Reginaldo Pereira, que sentia dificuldades de estudar e fazer os trabalhos escolares por causa da inexistência de uma biblioteca próxima a sua casa. Ele tinha que percorrer quase três quilômetros até chegar à Biblioteca Pública de Afogados, bairro vizinho. Reginaldo não achava justo que os jovens de sua comunidade passassem pelo mesmo sacrifício e acreditava que uma biblioteca os ajudaria a fazer os deveres escolares. Além disso, “os livros estimulam o crescimento pessoal e profissional, são opções que a juventude devem ter para traçar um futuro diferente daquele que tragicamente estariam condenados, vivendo na periferia, onde o poder público não tem interesse de investir, principalmente em educação”.
Imbuído do desejo de transformação e de solidariedade, Reginaldo procurou Cleonice da Silva, uma liderança da comunidade, e vários jovens moradores do local. Juntos correram atrás de apoio e conseguiram os primeiros livros. “Foram 800 que conseguimos com a Faculdade de Ciências de Administração de Pernambuco”, lembra Reginaldo. Depois eles conseguiram mesas, cadeiras, estantes, ventiladores e a casa, que até hoje é alugada ao irmão dele. O aluguel é pago por Reginaldo, mas as contas de água, luz e telefone, eles conseguiram através de um patrocínio com uma grande empresa de vestuário.
Com o espaço arrumado e equipado, é hora de começar a trabalhar. Foi quando em 11 de outubro de 2005, véspera do Dia das Crianças, a Biblioteca Comunitária Caranguejo Tabaires abriu as portas pela primeira vez. As crianças e os adultos foram chegando, atraídos pela novidade, mas ainda assim desconfiados. Os voluntários foram aparecendo também, uns para contar histórias para os pequenos freqüentadores, outros para ajudar na administração, outros para pintar. A biblioteca começou a atrair diversas pessoas solidárias, verdadeiros “amigos” da comunidade.
A partir daí o projeto só cresceu e as crianças, que são mais de 90% dos freqüentadores, passaram a ter a biblioteca como a segunda casa. A sociedade começou a conhecer o trabalho sério, iniciado por duas pessoas mas logo tinham mais de dez atuando na biblioteca em diversas atividades. Uma escola de francês que tem franquias no Recife doou bolsas de estudos para alguns voluntários, dentre eles a estudante Suely Souza, de 26 anos. Voluntária há 3 anos, Suely dedica 4 horas do seu dia, de segunda a sexta-feira, para auxiliar no setor administrativo, porém, sempre “quebra o galho” dando aulas de reforço a crianças de 7 a 10 anos. “Poder fazer parte da biblioteca é um prazer muito grande. Saber que posso fazer algo pelas crianças daqui não tem preço”, contou emocionada. Suely aproveita o que aprende no curso de francês e passa para as crianças na biblioteca. “Semanalmente, faço rodas de leitura em francês, ensino algumas músicas e o básico da língua, como saudações”, afirmou.
E ela já vê os frutos dessa dedicação: “As crianças daqui, hoje, pensam em estudar, fazer uma faculdade, até um intercâmbio, tudo isso graças à biblioteca, que trouxe esperança para eles, que antes não tinham nada”, falou orgulhosa.
Parceria – Para fortalecer ainda mais o trabalho e atender melhor a comunidade, a Biblioteca Caranguejo Tabaiares se uniu a mais sete iniciativas semelhantes que acreditam na democratização da cultura e do saber e formou a Rede de Bibliotecas Comunitárias. O grupo se ajuda no desenvolvimento de projetos de educação nos municípios de Recife, Olinda e Jaboatão.
Prêmio – Em 2010, a Biblioteca Caranguejo Tabaiares ganhou o Prêmio Machado de Assis, do projeto Pontos de Leitura, do Ministério da Cultura. A biblioteca recebeu um kit com 650 livros, mobília e computador. “Estamos fazendo uma nova arrumação nos livros que temos aqui. Precisamos tirar alguns para colocar os novos, pois não temos espaço para disponibilizar todos. Em janeiro de 2011, os frequentadores já poderão usufruir do novo arcevo”, afirmou Suely. Hoje, com quase 10 mil exemplares, a biblioteca atende uma média de cem crianças e adolescentes por dia. Lá, eles encontram diversas atividades, como, por exemplo, rodas de leitura, aulas de reforço e oficinas lúdicas. Nas férias, participam de oficinas de artesanato, sessões de cinema e outras atividades de lazer.
Futuro – Em 2011, Reginaldo Souza e Cleonice da Silva, junto com os nove voluntários que atualmente trabalham na biblioteca, têm um sonho ousado, que é o de construir uma nova biblioteca, três vezes maior do que a atual. O local já existe: é onde funciona o Clube do Idoso, um espaço de recreação para as pessoas da terceira idade que residem na comunidade. “Já temos a planta feita por uma engenheira voluntária, precisamos agora do material, por que até a mão-de-obra já tem - os moradores já se ofereceram para ajudar. Acredito que neste ano estaremos livres do aluguel e ofereceremos um serviço de melhor qualidade aos usuários da biblioteca”, disse Suely.
Para ajudar a Biblioteca Caranguejo Tabaiares a continuar este trabalho de resgate da dignidade de pequenos brasileiros, os interessados podem fazer uma doação de qualquer valor por meio da conta: Banco do Brasil - Agência: 1833-3 / Poupança: 24.332-9.
Já para quem mora na Região Metropolitana do Recife e gostaria de ser voluntário, pode procurar a biblioteca, que fica na rua Campo Tabaiares, 203, bairro da Ilha do Retiro - Recife (PE) CEP: 50750-251. Contatos pelo telefone (81) 3077-2535 ou pelo e-mail: bibliotecacomunitariact@gmail.com.

Livro: De que lado você está? De André Ebner.
















Resenha. Por: Alexandre de Freitas.
De que lado você está?
André Ebner, meio que despretensioso, mandou bem neste livro que brota do meio do povo com expressões de uma literatura de periferia que pensa, reage e produz os mais honestos e sinceros conhecimentos.
Não existe estilo que possa definir a arte. Ela é simplesmente (ou complexamente?) a Arte. Ela vem à mente e se manifesta de forma implacável numa sociedade injusta que produz seus excluídos. É uma voz que grita. Fazendo lembrar aquelas palavras do grande poeta paraibano, Augusto dos Anjos, porque o grito se alia a todos os anseios gemebundos daqueles que não são percebidos.
Constanta-se estas manifestações de arte quando André Ebner fala sobre a morte do seu Zé, mendigo e maltrapilho, mais fazia a alegria da garotada. Bêbedo e fedido, porém com uma dignidade comprovada nos seus sorrisos. A vida de sofrimento de seu Zé, ser humano como eu, você e muitos não foi nada fácil. Que o diga, se pudesse falar, um poodle de madame, animal que a elite cuida com zelo no seu mundo de opulência e vive melhor que o seu Zé.
O livro se sintetiza num constante vai-e-vem das palavras cuja ternura permeia nas linhas e nas entrelinhas, a ponto de uma única página ser ocupada por um poema de poucas palavras – três! Foram as palavras usadas para compor O poema mais bonito do mundo:
Eu te amo.
Gente, rostos, tesouros, caminhos e shopping Centers presentes aqui e ali, em constantes arranjos que nos levam a raciocinar. E comprovam que o poema na primeira pessoa por estarmos representando é o mais verdadeiro.
Quisera prosseguir... mas, nem tudo se explica por palavras. Ao ler o livro, a sensibilidade e a percepção haverão de dar maiores e mais completas explicações.
Obs.: toda renda do livro será destinada ao pagamento dos custos da impressão e ao Projeto Cre-ser. Ou seja, o livro não visa lucro.